Texto por Michele de Lucchi
Em 1972, Ettore Sottsass surgiu com um grande esquema arquitetural que contagiou todo o mundo e foi chamada de “The Planet as Festival” (o planeta como festival). Era altamente utópico, altamente visionário, um projeto radical, como muitos outros projetos da época, marcada como período da arquitetura radical. Na descrição do projeto, ele destacou a base pela qual era necessária uma reviravolta nas regras tradicionais e continuar a imaginar um universo (não só) arquitetural melhor… não havia nada mais para eu projetar, solitário, não um artista de grupo que sou – filho de uma geração preocupada com o futuro – um filho degenerado pois não estou absorvido nos destinos que me geraram, para qual os partidos políticos, os exércitos e afins assustadoramente apontaram.
Eu acreditava que não havia mais arquitetura para eu desenhar, digo, não há arquitetura que restou com algum propósito, nem mesmo como Andrea Branzi sabiamente diz “como um modelo para a sociedade” ou para colocar algo nas mãos das pessoas “como uma atividade psicomotora”… Portanto, desenvolvi esses projetos como se eles tivessem sido propostos por outra pessoa – alguém fora da trajetória do pensamento que ocupou a cidade, por considerar que esse pensamento de certa forma preocupado com a situação urbana até agora só propôs negligentemente a insana, doentia, perigosa e agressiva ideia de que os homens devem viver apenas para o trabalho e que o trabalho consiste em produzir e depois consumir.
Com meus projetos imaginei que algo tivesse mudado na moral do homem “trabalhador-produtor” e que se acreditava que os homens pudessem viver a vida por ela mesma e trabalhar (se, por acaso, quisessem), vindo a conhecer seus corpos, seus espíritos e seus sexos, que eles estivessem vivendo… Eu sei tudo isso muito bem – não só porque eu mesmo inventei, mas porque eu tenho ouvido por todos os lugares, por jovens, por poetas, por várias pessoas que realmente trabalham, por oprimidos, alienados, cansados, líderes indianos, gurus, crianças, prisioneiros… que a liberdade só pode vir de um conhecimento possível de que cada um de nós está vivendo e que aos poucos cada um de nós estará morrendo. (extraído de Casabella nº365, Maio de 1972).
Claramente o projeto não teve nenhuma consequência além da publicação na revista Casabella que, porém, influenciou muitas gerações de arquitetos e designers. No planeta como festival, vários elementos de arquitetura aparecem desenhados como objetos gentilmente posicionados pelo mundo, sobre o topo de vulcões, em penhascos íngremes entre as paredes rochosas do Grand Canyon, flutuando sobre o oceano ou transportados pelas águas de um rio plácido. O projeto Cube parece ter suas raízes diretas no mundo metafórico de Ettore Sottsass e é reminiscência das impressionantes porém sérias utopias de 50 anos atrás.
A ideia é construir um pequeno exemplar de arquitetura, uma cabine, talvez um abrigo, no topo de uma colina, em um monumento, em um edifício público, não importa onde, mas em um agradável lugar com uma bela e singular vista. A proposta, então, é criar um restaurante e acolher os clientes em um espaço único e encantador com pratos sofisticados feitos em cozinhas Electrolux. A ideia é mantê-lo aberto por seis meses e então mudar o local, a cidade, a nação, o continente e reposicionar este restaurante-tipo em alguma cobertura para novas surpresas, novos menus, novos clientes.
É um daqueles projetos que inauguram algo novo: na verdade, normalmente existem várias soluções que procuram resolver, mas que não abrem espaço para imaginação, inovação, evolução. Esse “Cube” que não é realmente um cubo, possui grande força pró-ativa e imediatamente apresenta seu propósito: desafiar a paralisia do pensar e do imaginar. Não só isso, como também contesta a imobilidade produzida pelo contínuo crescimento da burocracia que demanda a aprovação de governos, conselhos, oficiais de segurança, organizações de patrimônio, corpo de bombeiros etc. De fato, se as normas são necessárias e úteis para assegurar a qualidade arquitetônica, é também fato que os padrões se espalharam pelas escolhas de design à medida que os esquemas estão cada vez mais procurando interpretar a regulamentação vigente ao invés de agir de forma consciente e criativa dando continuidade à história da arquitetura.